Em abril, o governo publicou no Diário Oficial da União o Decreto nº 11.484, que apresenta uma série de diretrizes para promover e guiar a evolução da televisão digital brasileira, também conhecida como TV 3.0. Além da maior interatividade e inovação para a experiência do telespectador, a TV 3.0 trará benefícios para a publicidade no formato.
Conforme aponta Luiz Carlos Abrahão, diretor de tecnologia da Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert), um dos principais atributos da TV 3.0 será a viabilização da publicidade direcionada.
Assim, será possível diferenciar/segmentar o conteúdo pela região do usuário, já que a tecnologia de transmissão pelo ar oferecerá a oportunidade de redes com maior granularidade geográfica.
Também, será possível a integração da transmissão pelo ar com a transmissão via internet de banda larga, de forma personalizada, de acordo com o perfil do usuário/telespectador.
Diferentes tipos de segmentação na TV 3.0
A expectativa é que a transmissão pelo ar seja a mesma da internet, passando a usar tecnologias de transporte similares, como o IP, diz o coordenador do Fórum SBTVD, Luiz Fausto.
O Fórum SBTVD (Sistema Brasileiro de TV Digital Terrestre) é responsável pelo processo de digitalização da TV terrestre no País.
“Também pretendemos incluir tecnologia que permita regionalização maior ao reutilizar o mesmo canal de TV em transmissores vizinhos que transmitem programações diferentes”, completa o coordenador.
Dessa forma, será possível projetar a cobertura da emissora de acordo com a segmentação geográfica desejada.
Na transmissão pelo ar, Fausto explica que continuará a existir grade linear de programação, na qual é inserida a publicidade da forma tradicional.
Porém, na TV 3.0, o objetivo é incluir maior segmentação geográfica.
“Seria possível ter, dentro da grade linear de programação transmitida pelo ar, granularidade maior na regionalização da publicidade”, diz Fausto.
Já em relação ao conteúdo transmitido pela internet, existirá a possibilidade de combinar a segmentação geográfica com a por perfil.
O coordenador do Fórum SBTVD esclarece que a inserção de publicidade pela internet pode ocorrer na grade linear com o uso de targeted ads.
Isso substituiria a publicidade tradicional por publicidade personalizada para cada usuário em função do perfil e da localização do telespectador.
O diretor da Abert enfatiza que este modelo de segmentação, além de possibilitar granularidade regional de publicidade, também poderá ajudar na construção do perfil dos usuários.
Isso é fundamental para o segundo nível de segmentação possível, que se dará por meio de conteúdo/anúncio direcionado pela internet, personalizado de acordo com o perfil dos telespectadores.
Metrificação na TV 3.0
Tanto Fausto quanto Abrahão destacam que as métricas e os métodos para medir a eficácia e o impacto dos anúncios veiculados na TV 3.0 são independentes da tecnologia da TV 3.0.
Dessa forma, afirmam, continuará sendo possível obter métricas de audiência amostral tradicional, como as que são realizadas pelo People Meter, do Kantar Ibope Media.
Mas com algumas adequações adicionais, pela possibilidade de ter segmentação geográfica mais granular e substituição de conteúdo direcionado pela internet, mudando partes da grade linear.
“Por exemplo, as informações adicionais podem gerar desafios para a medida de audiência tradicional realizada pela Kantar Ibope Media por meio do People Meter, que monitora quais programas são vistos e por quem”, indica Fausto, do Fórum SBTVD.
O coordenador ressalta que, assim, será necessário realizar ajustes nos aparelhos e na metodologia de medição de audiência.
Vale destacar que a Kantar Ibope Media se associou ao Fórum SBTVD para acompanhar o desenvolvimento da TV 3.0 e fazer as inferências e ajustes necessários nos seus métodos de medição de audiência.
Além da audiência amostral tradicional, Abrahão, da Abert, pontua que outros métodos e métricas mais específicos de medição também poderão ser desenvolvidos,
Como, por exemplo, tendo como foco os usuários conectados à internet e identificados (logados) em aplicações (apps) de TV/emissoras.
“Há a ideia de que o próprio sistema TV 3.0 também disponha de API para facilitar o desenvolvimento de aplicativos voltados para tais medições de audiência”, revela Abrahão.
Desafios dos anunciantes na TV 3.0
Apesar de as métricas permanecerem quase as mesmas, a evolução da televisão digital brasileira trará desafios aos anunciantes.
Na visão de Abrahão, existem vários desafios.
A concorrência e a sobrecarga de informações exigirá anúncios atraentes e relevantes, por exemplo.
Há questões éticas e de privacidade, que demandam conformidade com regulamentações (como a Lei Geral de Proteção de Dados) e respeito à privacidade dos usuários.
Ainda, tem que se pensar na satisfação do usuário, equilibrando a interatividade sem prejudicar a experiência.
Por fim, a competição por espaços publicitários exige estratégia e criatividade para otimizar o retorno sobre o investimento (ROI).
Fausto salienta que outra variável desafiadora para os anunciantes é o próprio usuário, que sempre pode optar por não querer se identificar e compartilhar dados.
“Assim, o anunciante não vai conseguir fazer o direcionamento. Para o telespectador que tiver a antena, será possível fazer apenas o direcionamento geográfico”, complementa.
TV 3.0 transmitindo dados
Nos EUA, a próxima geração da TV insere os radiodifusores em categoria de mercado que não costuma ocupar, a de transmissão de dados.
Tanto Fausto quanto Abrahão entendem que essa é uma possibilidade que, no Brasil, de certa forma, já existe desde 2007, quando a televisão se tornou digital.
Segundo o diretor de tecnologia da Abert, isso acontece porque a transmissão digital se dá por meio de transporte de dados.
Com a TV 3.0, Fausto, do Fórum SBTVD, explica que essa transmissão de dados passará a ser transporte de dados IP, o que a torna muito similar à entrega de dados pela internet.
“Portanto, do ponto de vista técnico, não temos o desafio de permitir transmitir outros dados que não sejam relacionados ao conteúdo audiovisual”, ressalta o coordenador.
Entretanto, destaca que é um desafio desenvolver modelos de negócios e casos de uso para refletir na regulação de serviços permitindo esses usos desejados.