Antes de ser um “biquíni de bolinha amarelinha tão pequenininho”, o traje de banho não tinha como ser escondido na palma da mão, mas foi mesmo um sucesso desde a sua criação e lançamento, no dia 5 de julho de 1946. A data marcaria, então, o Dia Mundial do Biquíni!
De lá para cá, a peça sofreu inúmeras mudanças, ganhou modelagens diferentes e adeptos ao redor do globo. Mas como uma peça tão pequena causou uma revolução tão grande? Para explicar essa história, o gshow conversou com a consultora de moda Manu Carvalho e a professora de história da moda Laura Ferrazza.
Voltando no tempo
Entre as décadas de 20 e 30, alguns trajes de banho já começavam a dar as caras no verão europeu, ainda com tops de alças grossas e calcinha hot pants e, vez ou outra, com maiôs vazados nas laterais. Manu Carvalho acrescenta que estas roupas vieram, em grande parte, com a prática de esportes ao ar livre:
“Nos anos 20, eram peças coladas ao corpo e em modelagens bem grandes, como camisetas, regatas e bermudas. Logo depois veio a roupa de banho menor, como um maiô com a parte debaixo em modelagem de short e short-saia. Em seguida, veio como duas peças, inspiradas em atletas olímpicas, com tops tipo regata e shorts.”
Banhistas posam durante evento no hotel Molitor em 1934, em Paris — Foto: Gamma-Rapho/Getty Images
O hot pants, inclusive, foi desenvolvido nos anos 50 pelo figurinista Jacques Heim para atender a uma demanda de Hollywood, que, na época, exigia que o umbigo das atrizes ficasse coberto nas filmagens.
O modelo, como o conhecemos hoje, foi criado pelo designer francês Louis Réard – apesar de existirem estudos que apontam o uso de uma peça similar já na Antiguidade pela civilização romana. Réard batizou sua engenhoca de biquíni em referência ao Atol de Bikini, um conjunto de ilhas no Oceano Pacífico usado como local de testes para as primeiras bombas atômicas após o fim da Segunda Guerra Mundial.
O primeiro de muitos
Jade Picon é adepta de vários modelos de biquíni, dos maiores aos mais cavados — Foto: Fabrício Pioyani/Dilson Silva/AgNews
O lançamento do biquíni de Louis Réard aconteceu em outro ponto histórico muito importante, no Piscine Molitor. A piscina faz parte de um complexo esportivo de um dos mais icônicos hotéis do mundo, o Molitor. E a escolha não foi por acaso: o local, que era frequentado por anônimos endinheirados de Paris, passou a receber várias celebridades do mundo inteiro.
A peça exibida pela ex-dançarina e stripper Micheline Bernardini, hoje com 95 anos, contava com uma calcinha de cintura alta e top triangular. Segundo a professora Laura, a escolha da modelo tem um motivo:
“Como a calcinha era bastante cavada e a parte superior também pequena para a cultura da época, nenhuma modelo aceitou posar com ele e, por isso, Réard precisou contratar uma stripper para fazer as fotos […] e o modelo demorou para ser adotado amplamente.”
Modelo Micheline Bernardini usa primeiro biquíni lançado em 1946 por Louis Réard — Foto: Keystone-France/Gamma-Keystone via Getty Images
De acordo com um estudo apresentado por alunas do Instituto Federal do Rio Grande do Sul (IFRS), a curiosa estampa de jornal do biquíni seria uma referência ao termo “lingerie de jornal”, usado na época dos bombardeios atômicos pela mídia, porque “as pessoas chegavam aos hospitais nuas e eram cobertas com folhas de jornal”.
Com o passar dos anos, surgiram modelos cada vez mais ousados. Por volta de 1960, as estampas de poá viraram febre e, na década seguinte, foi a vez do top cortininha ganhar o favoritismo. As próprias grifes passaram a investir nas variações da peça, mas uma delas sairia das praias de Ipanema, no Rio de Janeiro, nos anos 80!
Não satisfeitas com os modelos largos importados da Europa ou Estados Unidos, as brasileiras começaram a enrolar as alterais das calcinhas para deixá-las mais cavadas. Reza a lenda que foi a modelo Rose Di Primo quem atraiu, pela primeira vez, os olhares dos banhistas com seu micro-biquíni “caseiro” e, só então, nasceria o famoso modelo asa-delta.
“As celebridades sempre tiveram um impacto sobre a moda. No caso do biquíni, os americanos eram muito puritanos para tomar à frente. Então, figuras famosas na Europa, como a Brigitte Bardot, começaram a usá-lo nos anos 60 em suas aparições em praias badaladas. O aval de figuras assim incentivou outras mulheres a ousar e o cinema também teve um papel, com filmes como ‘007’”, analisa Laura.
No Brasil, a especialista também cita outros nomes que ajudaram a impulsionar a peça e lembra que, nesta época, Bardot costumava viajar muito para o Rio de Janeiro – ganhando até a própria estátua em Búzios.
“Um dos ícones nacionais dessa época, final dos anos 60 e início dos 70, era a atriz Leila Diniz, que usava biquínis pequenos para a época, posava para as capas de revistas usando biquíni e marcou a história ao aparecer grávida usando biquíni. O fato é que a indústria da moda brasileira aproveitou o embalo e reproduziu muito esse e outros modelos.”
Betty Faria posa com Leila Diniz — Foto: Antônio Guerreiro
Já nos anos 90, surgiu um pouco de tudo misturado ao surfwear. Manu conta que a vibe californiana estava em alta devido ao sucesso da série “Baywatch”, com seu figurino repleto de biquínis e maiôs cavados. “[Nesse período] começam todas as variações possíveis, entrando no grande mix de todas as épocas.”
Tecnologicamente, o biquíni também passou por muitas transformações. Os tecidos usados inicialmente não eram próprios para a água e, aliado ao volume da peça, pesava no corpo em pouco tempo. Laura explica que, no século 19, quando o traje ainda era composto por uma blusa longa e acinturada, os tecidos eram fluidos.
Yanna Lavigne, Thais Carla e Juliana Paes posam usando biquínis com diferentes modelos de top — Foto: Dilson Silva/AgNews/Reprodução/Instagram
Depois, começaram a usar malha de lã, com uma fibra que secava com facilidade: “A partir dos anos 30, começaram a usar opções mais flexíveis por causa da descoberta do nylon e, cada vez mais, se desenvolveram tecidos próprios para o traje de banho.”
Peça revolucionária
Mais do que um simples traje de banho, o biquíni tem uma importância histórica na luta pela liberdade das mulheres. A professora de história da moda explica que esse “desnudamento do corpo feminino” aconteceu de forma gradual, primeiro nas praias e locais de lazer.
“[Esses espaços] permitiam a exibição do corpo de maneira mais explícita. As mulheres foram percebendo e exercendo o domínio sobre seus corpos e escolhendo mostrá-los, ou não, nesses trajes. Eles também acabaram impactando nos padrões de beleza e na aparência do corpo.”
Apesar de revolucionário, o biquíni também incentivou um padrão de beleza inalcansável — Foto: Pexels
Apesar da revolução no sentido de a peça trazer mais liberdade, Laura traz este outro lado negativo, “sempre num jogo de ‘quem pode e quem não pode’ usar biquíni”. Passaram-se décadas até derrubarem pensamentos opressores como o de que apenas corpos magros são “bem-vistos” em trajes de banho ou, então, tutoriais para “valorizar” corpos gordos.
A exemplo disso, já falamos por aqui como a magreza excessiva foi retomada como uma estética de moda – e a ela, soma-se uma onda de dietas perigosas e sem nenhum respaldo médico.
Modelos mais populares de biquínis
Dia Mundial do Biquíni: conheça a origem e mudanças desta peça revolucionária — Foto: Freepik
Discretos, chamativos, com ou sem bojo, divertidos ou basiquinhos: existe uma infinidade de tipos de biquíni que atende a todos os gostos, então listamos aqui os mais famosos.
- Biquíni com top cortininha: em formato triangular e ajustável.
- Hot pant: a calcinha mais larga fica quase como um micro shorts.
- Asa-delta: possui calcinha bem cavada na parte frontal e traseira.
- Cintura baixa: para quem gosta do biquíni abaixo do umbigo.
- Com amarração: possui cordinhas no top e na calcinha para amarrar de acordo com cada corpo.
- Nadador: top com alças mais grossas, semelhante aos maiôs das nadadoras.
- Tomara que caia: top sem alça com ou sem enchimento.
- Meia-taça: top estruturado em formato de meia Lua, também chamado de “push-up”, com enchimento que levanta os seios.
- Assimétrico: top de um ombro só.